Ecos da lagoa
Minha jangada vai sair pro mar
Vou trabalhar, meu bem querer
Se Deus quiser quando voltar do mar
Um peixe bom eu trazer
Meus companheiros também vão voltar
E a Deus do céu vamos agradecer
Dorival Caymmi
“no sul do Brasil, à margem da Lagoa dos Patos, existe uma pequena comunidade de pescadores, conhecida como Colônia Z3. a pesca artesanal é a base da sustentação econômica da grande parte dos seus seis mil habitantes. todos os anos as safras de corvina, tainha e do camarão alimentam o corpo e os sonhos dessas pessoas. sonhos como construir uma casa, comprar um barco e redes novas ou possibilitar que os filhos continuem estudando.”(eliostolz.manuelnogueira.marcelocuria)
Às margens da maior lagoa de água doce do mundo, vivendo a maior calamidade climática da nossa história recente, nos mobilizamos para fazer chegar uma escuta analítica mais longe. O trauma invade o psiquismo, abala a estrutura interna de cada um, deixa sequelas que podem ser mais ou menos duradouras, mais ou menos profundas, e requerem cuidado por mais tempo. Muitas pessoas perderam a integridade de seus corpos; o mundo externo inunda, como as águas, as mentes; e as relações entre as pessoas, poder estar na mente e no ouvido que escuta torna-se um abrigo fundamental. Sonhos, memórias, precisam ser resgatados, reconstruídos, ou criados, onde já não existem.
Freud (1930) diria que “nossas possibilidades de felicidade sempre são restringidas por nossa própria constituição. Já a infelicidade é muito menos difícil de experimentar. O sofrimento nos ameaça partir de 3 direções: de nosso próprio corpo (...), do mundo externo, que pode voltar-se contra nós com forças de destruição esmagadoras e impiedosas; e, finalmente, de nossos relacionamentos com os homens”. Atualmente, todas estas fontes de sofrimento têm forças avassaladoras, e cuidar do desamparo humano, nossa forma de estar no mundo, requer um trabalho em novas edições. Nós, da Sociedade Psicanalítica de Pelotas, desejamos oferecer nossa arte analítica na forma de escuta emergencial solidária aos atingidos pela enchente “na nossa casa”, nos municípios de Pelotas, Rio Grande e São José do Norte, por entender que, “depois que a água baixar”, como na fotografia de Fabrício Simões, “teremos de nos deparar com a realidade”. Álvaro Vinícius, filho de um dos fundadores da Colônia Z3, registrou a seguinte mensagem:
“a Z3 é um lugar muito bonito. Precisamos de investimento, ela é muito importante não só para Pelotas, mas para todo Rio Grande do Sul. Ela tem uma história que não pode acabar e que deve ser revitalizada. Vale a pena investir na natureza, que não pode se terminar. Tem muitas pessoas sem cultura, sem estudo, que hoje estão perdidas. Elas devem ficar na Z3, nesse lugar chamado de casa, com condições melhores de vida.”
“Ecoando” estas palavras de um nativo, nosso “investimento emocional” para estas populações é receber interessados da nossa região sul do Estado em atendimentos individuais online, e apoiar equipes de profissionais e gestores da saúde dos municípios locais em grupos operativos.
Diretoria da SPPEL
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