13 de abril - Aniversário de Jacques Lacan

Jacques Lacan - “Você pode saber o que disse, mas nunca o que o outro escutou”

“Façam como eu, não me imitem”. Como em tantas outras frases que se tornaram célebres, Lacan nos põe a pensar, em seu convite a produzir a partir de si mesmo.

Jacques Marie Émile Lacan nasceu em Paris no dia 13 de abril de 1901, primogênito de uma família da burguesia conservadora, católica. Teve uma irmã e dois irmãos, um dos quais morreu na infância, enquanto o outro se tornou um monge beneditino. Seu pai era sufocado pelo próprio pai, Émile. A mãe era totalmente voltada à religião. O jovem Jacques, arrogante e provocador, rompendo as tradições familiares, ao invés de assumir os negócios familiares, como o pai queria, optou pela medicina e interessou-se pelos filósofos (Spinoza, Nietzche, Kant, Heidegger), por sociólogos como Claude Lévi-Strauss e pela vanguarda literária, como Joyce, além de atrair o interesse dos surrealistas, como Salvador Dali, marcando sua obra. Fez psiquiatria e iniciou sua análise didática em 1932 com Loewenstein. No mesmo ano publicou sua tese de doutorado, sobre a história de uma mulher criminosa, o caso Aimée: Da psicose paranoica nas suas relações com a personalidade.

Embora recebesse enorme admiração dos intelectuais, artistas, filósofos, sociólogos, poetas, Lacan não encontrava o reconhecimento da Sociedade Psicanalítica de Paris. Seus trabalhos não eram considerados por seus pares e seu anticonformismo os irritava.

Lacan não escreveu muito, a maioria de seus artigos estão reunidos nos livros “Escritos” e “Novos Escritos”. A maior parte de sua obra provém de seus famosos Seminários, ministrados de 1952 a 1980, transcritos e publicados por Jacques Alain-Miller. 

Sua presença marcante, lucidez e carisma atraiam grandes figuras da psicanálise e da cultura. Françoise Dolto, Claude Lévi-Strauss, Jean Laplanche, J. B. Pontalis, Didier Anzieu, Jacques-Derrida, Gilles Deleuze, Michel Foucault, André Green, Glauber Rocha foram alguns de seus vários frequentadores ilustres. 

Entre convergências e divergências, ódios e amores, Lacan recolocou a psicanálise no debate com a ciência, com a filosofia, com a sociologia, com a literatura, com a cultura em geral. Caracterizou-se também como crítico da própria psicanálise. “Sejam vocês lacanianos, se quiserem. Eu sou freudiano”. Considerava que havia a necessidade de um retorno a Freud, relendo e aprofundando seus textos, mantendo-se fiel aos conceitos fundamentais da psicanálise, citados: inconsciente, repetição, transferência e pulsão.  Ao mesmo tempo aliava-se aos conhecimentos da filosofia, adotando um questionamento infinito sobre o estatuto da verdade, do ser. A partir da linguística de Saussure, formulou as ideias sobre o significante e de um inconsciente estruturado como linguagem. Da antropologia de Lévi-Strauss partiu a noção de simbólico, depois elaborando sua tópica S.I.R (simbólico, imaginário, real), bem como uma releitura da interdição do incesto e do complexo edípico. Colocando o acento no Inconsciente e no Isso, em detrimento do Eu, Lacan opõe-se à Psicologia do Ego, que chamava de versão adocicada e adaptativa da mensagem freudiana, à qual propunha a peste, a visão subversiva. 

Lacan fez a exposição de seu trabalho sobre o “Estádio do Espelho” no Congresso Internacional da IPA de 1936, mas Ernest Jones cortou sua exposição em dez minutos, o que o fez abandonar o congresso, indo a Berlim assistir aos Jogos Olímpicos. No congresso de 1949 retoma e amplia o assunto. Nesta concepção, o ser humano, prematuro no nascimento, só encontra uma solução para o desamparo através de uma precipitação que antecipa seu amadurecimento, ao se atirar na imagem do outro que encontra diante de si, ou seja, no reconhecimento, pela criança a partir de seis meses, de sua imagem no espelho. Aí Lacan situa a constituição do eu, articula narcisismo e identificação. “É como outro que sou levado a conhecer o mundo: sendo dessa forma, normalmente constituinte da organização do Eu uma dimensão paranoica”.

Lacan teve três filhas e um filho em dois casamentos tumultuados, com relacionamentos conturbados que, juntamente com os conflitos de sua família de origem, suscitaram muitas de suas ideias teóricas. Aos fins de semana, Lacan retirava-se em sua casa de campo para trabalhar, receber pacientes, amigos, para se divertir. Colecionava livros e objetos de arte, inclusive o famoso quadro de Coubert, A Origem do Mundo. Gostava de fazer teatro, fantasiar-se, dançar.

Lacan foi uma figura polêmica, singular; sua fala enigmática e conceitos herméticos criaram seguidores, mas também inimizades e cisões no movimento psicanalítico. Firmou-se como um dos pensadores originais da psicanálise. Nossa homenagem no seu aniversário! 

Sandra Gehling Bertoldi 

Psicanalista SPPEL/SBPdePA/FEBRAPSI/IPA